setembro 16, 2016 - Artigos
Envelhecer com a Doença Bipolar
A Doença bipolar pode tornar-se mais fácil de gerir na velhice, mas deve estar atento e perceber se o seu medicamento continua a manter o equilíbrio pretendido.Um dia percebe que as linhas que definiam o seu sorriso se tornaram em rugas. Ou talvez que a sua coluna e os seus joelhos rangem após um jogo de futebol ocasional. É inevitável: a passagem do tempo traz mudanças no seu corpo, nas relações e nos pontos de vista. O manto de maturidade, muitas vezes promove um senso mais forte de si mesmo, mesmo que a meia-idade marque a chegada de alguns problemas médicos. Os pais têm de se adaptar a um ninho vazio, o que pode ser um desafio emocional, ao mesmo tempo que deixa mais tempo e liberdade para se concentrarem em interesses pessoais. O mesmo acontece com aqueles que se afastam do local de trabalho. De que forma é que a doença bipolar se manifesta nisto tudo? As alterações de humor podem modificar ou intensificar-se. A medicação que funcionou durante anos pode perder o efeito ou contribuir para o início de outros problemas de saúde. No entanto, o conhecimento acumulado ao longo dos anos pode traduzir-se numa melhor compreensão de como manter o equilíbrio. É claro, a caminhada com a doença bipolar é diferente para cada pessoa. Aos 69 anos, Dennis não notou nenhuma diferença nos seus sintomas de bipolar tipo I. “Eles dizem-me sempre que à medida que envelhecemos, nós mudamos” disse. “Eu tenho-me dado bem com a mesma dose de medicação desde há 25 anos. Talvez estas coisas aconteçam um pouco mais tarde do que as pessoas pensam”. Ou então, alguns créditos vão para as caminhadas diárias que o Dennis faz pelos arredores de Boston, e para o seu envolvimento de longo prazo com a delegação local da União de Apoio à Depressão e Doença Bipolar. Qualquer coisa que o ajude a manter-se activo e em contacto com a sua rede de suporte social, irá fazer com que a terceira fase da vida corra de forma mais suave. Acontece que a “idade funcional” – como desempenhamos as tarefas diárias, como nos exercitamos e o que fazemos por diversão – pode ser um trunfo para a idade cronológica. “Agora, existem mais estudos que suportam a ideia que nós controlamos a forma como envelhecemos, para além do que a genética previu para nós” – diz Brent P. Forester, médico e investigador, Chefe da Divisão de Psiquiatria Geriátrica do Hospital de McLean, uma filiação da Faculdade de Medicina de Harvard. “Nós podemos influenciar a forma como envelhecemos porque conseguimos controlar a maneira como vivemos”. Um dos pilares do envelhecimento saudável é o estabelecimento de relações sociais, segundo Forester: “As pessoas que mantêm as relações com os outros tendem a ficar melhor. Isso é muito, muito importante.” Claro, que também é um fator que está bem documentado na recuperação das doenças psiquiátricas. Beverly, da Virginia, indica que a proximidade das pessoas da rede de suporte social, incluindo a família e os amigos chegados, é uma das das suas principais estratégias de coping (forma de enfrentar determinada situação) . Também consta da lista: oito ou nove horas de sono por noite. “Como eu era uma “coruja da noite”, preciso de muita disciplina para gerir o sono”, disse ela, “mas tenho tido sucesso, estou motivada para continuar a esforçar-me por isso vou continuar a ter sucesso”. Beverly, que foi diagnosticada com doença bipolar tipo II em 1997, está a resistir a várias mudanças da meia-idade. Agora com 53, ela tem menos períodos de elação do humor do que quando tinha 30 ou 40 – um padrão de “nivelamento” do estado de humor descrito também pelos outros. É comum que as prescrições de lentes oftálmicas sejam actualizadas várias vezes, por volta dos 50 anos, depois de se terem mantido constantes durante anos; o mesmo acontece com a prescrição dos medicamentos psiquiátricos. A medicação que foi eficaz durante anos, para a Beverly, deixou de ter um efeito tão bom. “Parece que me está a segurar a um estado moderado de depressão”, diz. Ela também notou uma maior alteração na concentração e na memória. Não há muito tempo, ela lidava com níveis muito elevados de stresse no seu trabalho, enquanto terapeuta da fala nas escolas públicas. Recentemente, demorou quatro horas para pagar quatro contas. Em consequência disto, ela agora só consegue comprometer-se com uma tarefa por dia, como ir para um compromisso ou tomar banho. “Mas eu vejo-me como uma pessoa que nunca perde a esperança”, afirma. “Eu penso, “Isto vai melhorar”. Questões MédicasBeverly tem um novo desafio para dominar: foi diagnosticada como pré-diabética. Pesquisas revelam que as pessoas com doença bipolar têm taxas mais elevadas de doenças cardiovasculares, diabetes, obesidade, complicações derivadas de hábitos tabágicos, e outros problemas de saúde do que aqueles que não têm nenhum diagnóstico de doença psiquiátrica. Embora os especialistas não consigam identificar a origem dessas disparidades, as possíveis causas incluem a negligência no autocuidado devido às alterações de humor, efeitos a longo prazo dos psicofármacos, e factores biológicos subjacentes tais como as inflamações. É principalmente devido a condições de saúde crónicas – não questões psiquiátricas –que os sujeitos que sofrem de doença bipolar estão mais propensos a serem internados em serviços de cuidados continuados de saúde e que a sua esperança média de vida diminua. Na última década, Forester notou que os psiquiatras começaram a reconhecer a importância da monitorização, não apenas dos sintomas psicológicos, mas também dos indicadores físicos que sinalizam o aumento do risco de diabetes, acidentes vasculares cerebrais e doenças cardiovasculares. Isso incluiu, hipertensão arterial, níveis elevados de açúcar no sangue (glucose), níveis elevados de “mau” colesterol e outros ácidos gordos, e excesso de peso, principalmente na zona abdominal. Todos juntos, estes factores constituem algo chamado de Síndrome Metabólica. A Síndrome Metabólica não está, certamente, limitada às pessoas com doença bipolar. No entanto, quer a lassidão depressiva quer o “desligar” da realidade maníaco dificultam a manutenção de uma dieta saudável, exercício físico regular, e manterem-se conscientes dos cuidados médicos a ter –elementos importantes para a prevenção e gestão das doenças crónicas. Por outro lado, o elevado colesterol e o aumento de peso podem ser efeitos secundários dos tradicionais estabilizadores de humor. Com o tempo, as mudanças, relacionadas com a idade, que acontecem no corpo, agravam os resultados. O fígado não funciona tão bem para decompor os medicamentos; e os rins não funcionam tão rapidamente para os expulsar. Como sempre, é essencial manter uma relação de proximidade com os seus médicos assistentes, para monitorizar se os seus medicamentos estão a fazer o efeito devido e de que forma o seu organismo os está a tolerar. A escolha do tratamento de primeira linha pode ser diferente para os sujeitos que desenvolveram a doença bipolar depois dos 50 anos – o que representa cerca de 10% da população diagnosticada com a doença. Depois de viver com depressão, desde os seus 20 nos, Kathy teve o seu primeiro episódio hipomaníaco há quatro anos atrás, tinha 59 anos. O episódio desencadeou-se após quatro dias sem dormir na sequência da morte do irmão. “Alguma coisa explodiu,” recorda. “Fiquei com muito mais energia. Falava depressa. Era incapaz de fazer uma pausa para ouvir. Isto durou um mês”. “A minha melhor amiga dizia-me repetidamente que se passava algo de errado comigo o que durante algum tempo influenciou a nossa relação. Ela incentivava-me a pedir ajuda. Eu não estava preparada para ouvir. Ela colocou a nossa amizade em causa. Admiro a coragem dela por ter assumido esse risco.” Kathy iniciou uma nova medicação. Ainda assim, ela não aceitou plenamente a mudança no diagnóstico, principalmente por se manifestar tão tarde na sua vida. “Eu sinto uma grande tristeza por ter uma doença mental,”, disse a Kathy. “Sempre tive. Mas com a idade vem a sabedoria. E eu lembro-me que as coisas más também acontecem a pessoas boas.” “Mas com a idade vem a sabedoria… Eu percebi que a melhor resposta é a bondade para comigo e com os outros” Ela acrescenta: "Eu percebi que a melhor resposta é a bondade para comigo e com os outros. Não significa que eu sou boa no que faço, mas, por vezes, lembrar é suficiente". Em Março de 2014, Kathy cria o Faith, Hope and Recovery para oferecer um espaço seguro para as pessoas falarem sobre a doença mental a partir de uma perspectiva de fé. "Eu acredito que a vida é mais do que um cérebro e um corpo, envolve a alma", ela explica. "Graças a Deus temos médicos fenomenais e terapeutas, mas verdade seja dita as pessoas que me fizeram superar eram amigas de fé”. Ela acrescenta: "Todos nós temos dificuldades, e o melhor que podemos fazer é andar uns com os outros e cuidar uns dos outros." A ciência dizApesar da pouca investigação que tem sido publicada sobre a doença bipolar na velhice, há algumas evidências de que os padrões dos episódios de humor mudam nesta fase. Adultos idosos podem ser mais susceptíveis a ter ciclos rápidos, ou quatro episódios de depressão ou mania ao longo de doze meses, de acordo com a Cascade Behavioral Health no Estado de Washington. Alguns estudos sugerem que quando as mulheres com doença bipolar chegam à transição da menopausa, elas têm maiores taxas de episódios depressivos e um aumento no número de episódios de humor num determinado ano. Esse tem sido o caso de Nancy de Alberta, 58, que foi diagnosticado com doença bipolar I quando tinha trinta anos. O seu humor tinha estabilizado, voltando as crises em conjunto com a menopausa. Ela lembra um ciclo de hipomania e depressão seguido por "um muito mau episódio maníaco", quando sentiu que as músicas no rádio foram escritas especificamente para ela, não conseguia dormir, e parecia olhar para o mundo através de uma lente olho de peixe. No entanto, Martha Sajatovic, médica, professora de psiquiatria na Case Western Reserve University School of Medicine, em Cleveland, adverte que estabelecer relações causais entre a menopausa e sintomas bipolares seria precoce. "Há todo um campo de especulação", diz ela. "Nós temos alguns dados, mas não o suficiente para tirar conclusões reais." Sajatovic tem estudado a doença bipolar com início tardio, também chamada bipolar geriátrica. Ela e os seus colegas compararam as escolhas de tratamento para mania em pessoas com idades entre 60 anos ou mais numa grande escala, numa amostra aleatória controlada. Até que tenhamos mais estudos desse tipo, diz ela, não teremos dados significativos sobre bipolar e envelhecimento. No entanto, tal informação será cada vez mais necessária nas próximas décadas. Pessoas com idades entre 65 e mais velhos eram cerca de 44,7 milhões nos EUA em 2013, mas em 2060 espera-se mais do que o dobro podendo chegar a 98 milhões, prevê o Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos EUA. Mais velho & SábioUma vantagem de envelhecer com transtorno bipolar: A experiência pode ser um grande professor. Anos a gerir a doença normalmente produz um maior auto-conhecimento de quais as estratégias que funcionam, que desencadeiam a crise e o que evitar. "Aprendes com os erros do passado porque não queres fazê-los novamente", diz Paul de Illinois, 62. "Estou cansado de recair." “Tu aprendes com os erros do passado que não queres voltar a cometer” Ele é cuidadoso e mantem-se com o seu plano de medicação, porque, "Eu aprendi que é uma coisa que sai cara quando se tem uma crise maníaca." Pat, 52, foi finalmente diagnosticado com bipolar II passados sete anos. Aos 30 anos, diz ela, as consequências da "exuberância selvagem" poderiam levá-la a períodos depressivos. Isso não é mais um problema, mas ela fez uma espécie de paz com os padrões de humor. "Eu não sei se este é um produto da idade e da terapia, mas parece que quando as depressões surgem agora, lembro me que isso não vai durar para sempre", explica Pat. "Eu vou recuperar" E em vez de se perder em "ideias psicadélicas" quando fica com o pensamento acelerado, diz ela, "energia hipomaníaca” vira-se para o trabalho, principalmente para dar continuidade a projectos que são abandonados quando estou depressiva." Beverly, o fonoaudiólogo da Virginia, diz que o tempo tem ajudado não só a si mesmo, mas aos que estão ao seu redor. "Como eu já amadureci, o mesmo acontece com os meus amigos e entes queridos", diz ela. " Conhecemo-nos melhor, e as nossas relações são mais estáveis. Eu acho que isso me ajuda a ter uma rede de apoio forte, que está melhor preparada para me ajudar do que quando eramos todos muito mais jovens e inexperientes." Rede SocialA relação social beneficia o bem-estar em qualquer idade, mas nutrir relacionamentos pode exigir mais esforço com a idade. Se deixou o local de trabalho onde tinha o seu grupo de pessoas conhecidas, estenda um convite para o almoço com ex-colegas de trabalho. Use as redes sociais para manter-se em contacto com a família mais distante e amigos que se afastaram. Olhe para o voluntariado –há uma variedade de oportunidades que se podem adequar ao tempo e esforço que você pode proporcionar. Se isso lhe soa assustador, lembre-se do retorno. Estudos têm mostrado uma ligação entre baixos níveis de apoio social percecionado e sintomas de humor mais graves, bem como uma ligação entre as redes sociais que não fornecem suporte e aumento da probabilidade de não-adesão à medicação. Pelo menos, não se senta em casa sozinho. "Mesmo que esteja apenas a observar as pessoas no parque, ou a pedir um café num bar e ficar sentado ao lado de alguém em outra mesa, você pode sentir um senso de comunidade", diz a terapeuta de Toronto, Roxanne Ramjattan, "Participar mesmo que seja nessas interacções mínimas é vital e pode ajudar a evitar o isolamento social." Muitas comunidades têm programas gratuitos ou com desconto para seniores adultos –yoga, tai chi, aulas de dança modificada, grupos de leitura, e mais que incentivam a interacção social, mantendo-o fisicamente, emocionalmente e mentalmente ativo. Verifique na sua área de residência, a existência de associações recreativas ou centros comunitários, e as bibliotecas próximas. A Sabedoria da idadeA Maturidade pode reforçar a sua capacidade de viver bem com o transtorno bipolar. Adira à experiência. Quanto maior o seu auto-conhecimento, melhor a forma como pode gerir o seu bem-estar. Existem maneiras de acelerar a sua compreensão: terapia psicológica, é claro. Monitorização do seu humor, especialmente se você correlacionar padrões de sono, dieta e exercício com flutuações emocionais e níveis de energia. Consulta com médicos, familiares e amigos para recolher informação sobre os seus desencadeadores de crise mais típicos, sintomas comuns e soluções eficazes. Confie nos seus instintos. Ao longo do tempo, Nancy de Alberta tem percebido que ela conhece os seus sintomas melhor que ninguém. "Eu costumava pensar que os psiquiatras eram deuses, que eles sabiam tudo", diz ela. "Mas eles cometem erros, e eu estou a aprender que o meu corpo é o meu templo e eu conheço-o melhor do que ninguém. E eu preciso de me ouvir a mim mesmo. " Advogado para si mesmo. Uma das vantagens de idade é falar com a sua mente. Muitas pessoas têm medo de ser visto como um "paciente problema" se pressionarem por mudanças de medicação, de acordo com Pat Miller do Tennessee. Ela passou quase três anos a receber prescrições do seu médico para entender o quão sensível ela é às dosagens tradicionais. Ela diz que ele "ainda fica perplexo" quando ela descreve as reacções do seu corpo, “mas ele agora ouve, em vez de ignorar." Bibliografia |