janeiro 1, 2015 - Artigos
Kay Redfield Jamison, especialista em Doenças Maníaco-Depressivas
Imagem de Kay Redfield Jamison Começou a desenvolver a sua carreira no momento em que tomou a pesada decisão de revelar o seu diagnóstico de Patologia BipolarA cientista Kay Redfield Jamison, autora da obra autobiográfica acerca da Doença Bipolar “Uma Mente Inquieta”, começou a desenvolver a sua carreira no momento em que tomou a pesada decisão de revelar o seu diagnóstico de Patologia Bipolar. E repare onde é que isso a levou! Escrito por Maureen Salamon Loura, com uma camisola preta de gola alta e uma saia de padrão floral, a Dra. Kay Redfield Jamison apresenta-se como o auge da elegância quando subiu ao palco no 26º Simpósio Anual da Investigação em Saúde Mental em Nova York. A cientista sofreu na pele o peso dos estereótipos e de informações deturpadas sobre o que é a “doença mental”. Jamison foi deixando por terra as especulações desde que escreveu o livro “Uma Mente Inquieta” lançado em 1995. Até então, apenas algumas pessoas criativas, como um director de teatro Josh Logan e uma actriz Patty Duke tinham falado sobre, o que era até então chamada, a Doença Maníaco-Depressiva. Actualmente, a Dra. Jamison é professora na prestigiada Universidade de Medicina de John Hopkins e decidiu revelar o seu diagnóstico. Os seus pacientes enfatizaram a ambiguidade que notaram entre o que viam e a “realidade interior” da Dra. Jamison, referindo “Mas a Dra. parece tão normal…” ao que ela respondeu “Nem todas as águas são limpas…”. Não foram só os pacientes da Dra. Jamison que se mostraram confusos com a revelação do seu diagnóstico, mas também os seus colegas de profissão, visto que lhes faria “confusão”, uma vez que ela, no momento em que revelou o seu diagnóstico, já se teria tornado numa especialista em Doenças Maníaco-Depressivas, termo que ainda prefere usar. A título de referência, a Dra. Jamison foi co-autora de um livro que se tornaria uma referência para a Medicina – A Doença Maníco-Depressiva, escrito juntamente com o investigador e médico Frederick K. um dos poucos colegas que tinha conhecimento da sua condição. Este livro foi publicado em 1990 e manteve-se com o título original durante três anos, passando a denominar-se “Tocando no Fogo: Doença Maníaco-Depressiva e o Temperamento Artístico” de fácil leitura e que explorava a ligação entre a doença e a criatividade. Assim, avançou com a ideia “provocante” de que a doença poderá potenciar não só aspectos negativos, mas também positivos (o seu próximo livro sobre o poeta Robert Lowell, que deverá ser publicado ainda este ano, vem abordar especificamente este tema). O livro, Uma Mente Inquieta mudou tudo na Dra. Jamison. A decisão de revelar o seu diagnóstico, doença que estudava a nível académico, foi algo que durante muito tempo ponderou de forma cuidadosa. “Eu sabia que essa revelação me faria desistir da minha prática clínica diária (Psicóloga Clínica) e que as implicações profissionais e financeiras iriam ser substanciais” – revelou a Dra. Jamison, há uns meses, no Simpósio de Investigação, organizado pela Fundação de Pesquisa do Cérebro & Comportamento. “Eu tratei de pessoas, durante muito tempo, e sabia que a minha decisão de parar de fazer clínica seria uma perda… eu amava a clínica e estava muito relutante em desistir” “Actos de crueldade e criticismo têm sido compensados por inúmeros actos de generosidade”.Lembrou a Dra. Jamison ao falar da sua trajectória de revelação do seu diagnóstico. Existem algumas celebridades que hoje em dia já admitiram o diagnóstico de patologia Bipolar, tais como músicos, atores e até mesmo atletas, mas fora desta esfera mediática esta revelação é vista ainda como um “risco”. Para alguém com uma carreira de 20 anos como a Dra. Jamison, esta demorou a resolver quase o inimaginável. “Kay Redfield Jamison era já uma lenda, muito, muito, muito antes do seu tempo” referiu o moderador e médico Robert Hirschfeld, um dos principais especialistas na Perturbação Bipolar. “Actualmente, embora seja comum uma pessoa falar sobre o seu diagnóstico e evolução da doença, Kay foi provavelmente a primeira pessoa de destaque a partilhar o seu diagnóstico, de patologia bipolar, com o mundo e a experienciar como esta experiência pode ser devastadora”. Silêncio Sufocante Voltando aos anos 68, há quatro décadas atrás, percebe-se que foi aqui que se chegou pela primeira vez a um rótulo para os sintomas de humor e comportamento considerados “extravagantes”, que se iniciavam no final da adolescência. Jamison tinha iniciado a sua carreira na Universidade da Califórnia-Los Angeles (UCLA) quando o seu namorado a diagnosticou com psicose maníaco-depressiva, em 1974. Jamison encontrava-se a meio de um episódio maníaco major caracterizado por períodos em que não dormia e em que efectuava gastos excessivos em livros, jóias caras e roupas provocantes. A título de exemplo, Jamison comprou uma dúzia de kits contra o ataque de cobras porque sentiu a Deus lhe teria dado a informação de que estaria para acontecer uma infestação eminente desta espécie. O uso do Lithium como tratamento para os episódios de mania, só foi usado mais recentemente. No caso da Dra. Jamison este medicamento foi-lhe prescrito em doses muito elevadas provocando sérios efeitos colaterais, físicos e mentais, afectando a sua concentração, memória, energia e leitura. Jamison foi criada no seio de uma família com raízes militares e que valorizava a independência, pelo que esta não gostaria de sentir como se precisasse de uma “muleta” para lidar com a sua condição. No Simpósio, Jamison referiu perante a plateia que após ter sido feito o diagnóstico aderiu à medicação com alguma relutância, mas que o fazia de forma irregular. Após o seu discurso, e numa sessão de perguntas e respostas, a Dra. admitiu que aderir à medicação é um dos maiores desafios na gestão da doença, referindo “Cerca de 50% dos pacientes não tomam os medicamentos prescritos; É um grande problema. Não por não se ter a medicação e o tratamento, mas sim porque as pessoas não querem aderir”. A Dra. Jamison passou por quase uma década de altos e baixos, com alucinações, delírios e uma tentativa de suicídio antes de se comprometer com um tratamento. Referiu ainda que com a sua doença controlada houveram melhorias significativas na sua criatividade e produtividade. Para além dos seus superiores na John Hopkins, Jamison guardou segredo acerca do seu diagnóstico, mas foi descobrindo que estar em silêncio se tornaria cada vez mais insuportável, até mesmo a sua luta interna contra os seus medos do “rótulo” que poderia advir dos seus colegas da universidade e colegas médicos que a poderiam ver como a “psicóloga Maníaco-Depressiva” em vez de ser vista, apenas, como uma psicóloga que tinha uma doença Maníaco-Depressiva. Recusou então vestir essa pele de estigmatizada e o que poderia enfrentar referindo “Poderia esperar que até houvesse compreensão, mas não dar isso como garantido”. Contudo, o seu desejo de parar de viver numa mentira preocupava-a, assim como, as consequências da revelação do seu diagnóstico, o que pensariam os pais (reservados e que se regiam pela ética e que defendiam que as pessoas devem manter os seus problemas para si mesmos) referindo “Ser um Episcopal não ajuda”, ironizando a auto-depreciação, arrancando risos da multidão que se encontrava no Simpósio, acrescentando “Eu mantive os meus medos escondidos e cresci hermeticamente fechada como um cofre”. Tendo tomado a difícil decisão de escrever sobre ela e sobre os seus “mundos estranhamente intersectoriais”, acabou por propor ao seu chefe de departamento esta decisão que foi recebida com aceitação. Como o livro de memórias seria recebido pelo resto do mundo, ela não tinha certezas, mas uma coisa era dada como certa e rapidamente se tornou clara: as pessoas iriam ter conhecimento. Na verdade, o Jornal de Washington publicou uma nota de imprensa a fazer a cobertura, antes da publicação do livro “Havia a noção de que alguns colegas de quem eu achava que iriam ter vergonha das minhas revelações não a tiveram, eles estavam sim constrangidos por mim”.A Dra. Jamison revelou aos pacientes o seu diagnóstico e o lançamento do seu novo livro usando a analogia Brooks Brothers para articular com o efeito surpresa. Recebeu cerca de 30.000 cartas depois do lançamento do livro de leitores indignados referindo que “a estabilidade financeira e realizações profissionais da Dra. Jamison não lhe permitiam entender o que era a doença mental”, respondendo que “o pânico da doença bipolar é como o pânico do cancro, não se discrimina”. A diversidade de Reações As reacções à revelação pública da Dra. Jamison foram várias, algumas de carácter insensível, generoso e até cruel. Por exemplo, do seu Jardineiro que ao aproximar-se dela no jardim, e referindo-se à sua tendência para a organização, disse “Meu Deus, Dra. Jamison, se eu soubesse que tinha esse tipo de problema, eu teria organizado as flores por cores mais suaves”. Por sua vez, em Hopkins os associados pertencentes a várias especialidades médicas reuniram-se no sentido de apoiá-la, telefonaram até a falar sobre a sua própria experiência com as Perturbações do Humor. Mas no Encontro Anual da Associação Americana de Psiquiatria alguns participantes desviavam a sua atenção para a sua presença, relembra “Fiquei impressionada com o silêncio; fiquei congelada. Havia o sentimento de que eu deveria ficar envergonhada com as minhas revelações, quando eu não me sentia… eles estavam constrangidos por mim”. Da mesma forma, alguns leitores escreveram sobre ela julgando-a, referindo “A loucura e o desespero eram precisamente o que eu merecia… e poderia esperar ficar queimada para a eternidade”. A Dra. Jamison referiu que o seu falecido marido, o neurocientista Richard Wyatt sabia como transmitir-lhe calma ao lidar com estes comentários aversivos, aconselhava-a mesmo, a ignorar os “feios”, e a reorganizar a cura para alma, referindo “Muitas vezes, o meu marido reunia os nossos amigos.. porque sabia que o calor e o riso diminui a dor”. No fim, Jamison referiu que “a maioria das pessoas tiveram reacções tão diversas que eu não podia ter imaginado”, acrescentando que “actos de crueldade e crítica têm sido largamente compensados por inúmeros actos de generosidade”. É seguro dizer que a revelação do diagnóstico não custou assim tanto, a nível profissional. Jamison continuou a leccionar e é neste momento co-directora do Centro das Patologias do Humor em Hopkins. O seu Currículo Vitae chega até às 25 páginas, fazendo referência às bolsas de estudo, aos prémios recebidos e às suas publicações. Suspendeu a sua prática clínica e foi tão doloroso quanto previa “sinto falta de ver os pacientes”, disse Jamison à Revista BP, após a sua palestra. Mensagem de Esperança O livro “Uma Mente Inquieta” deu a Jamison uma segunda oportunidade de carreira, como advogada. Jamison chegou ao público em grande escala através de numerosas entrevistas em programas como Larry King Live e a Oprah. As suas inúmeras palestras tiveram sempre um cunho mais pessoal. Embora Redfield seja reticente acerca da revelação dos detalhes dos seus sintomas e abordagem da gestão da doença, Jamison passa uma mensagem de esperança para as crianças, adolescentes e estudantes para quem palestra em todo o país. No Simpósio, Jamison disse à plateia que muitos estudantes que partilham da sua doença perguntam se ela se preocupa em “ficar novamente doente” respondendo que “sim, é claro que me preocupo… todos os dias”, acrescentando-lhes que “é difícil ficar bem e estar bem, mas isso de certeza pode ser feito”. Partilhou também uma piada, acerca de uma situação - um estudante aproximou-se dela depois de um discurso no Colorado e colocou-lhe a mão na mão dela e perguntou se esta ela estaria mesmo bem… Jamison colocou a mão na sua mala e tirou um porta chaves do Bugs Bunny que ela adorava e deu ao estudante dizendo-lhe “É o meu charme extra e da sorte, porque assim não tinha apenas um pé de coelho mas quatro”, e a plateia levantou-se e aplaudiu-a de pé, assegurando-lhe que o Bugs Bunny lhe traria a mesma sorte que a ela lhe trouxe. Fonte: http://www.bphope.com/kay-redfield-jamison-risk-and-reward Livros à venda na ADEB |